Análise do artigo 2,§2 da CLT, com observância dos elementos: controle, grupo, consórcio, desconsideração da personalidade jurídica








A consolidação das leis do trabalho buscou definir, para termos de responsabilização, de uma forma não muito técnica o empresário individual e o empresário coletivo pelos elementos fundamentais que o compõem. Requião (2006), que por opção será utilizado como paradigma no estudo, divide-se estes elementos em iniciativa e risco. Entretanto, torna-se imperioso definir o que é empresa, antes de realizar um estudo do texto da consolidação.

Requião (2006) define empresa como “exercício, pelo empresário, de atividade organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” e o mesmo prossegue na sua construção abordando uma informação fundamental para que se possa realizar o trabalho com o artigo da CLT, quando o autor informa que:
Sendo a empresa, afinal, uma organização que ajusta os fatores econômicos - natureza, capital e trabalho - para a produção ou circulação de bens ou de serviços, não se pode, por isso, menosprezar o estudo da participação dos colaboradores, que integram o setor do trabalho

A partir deste aspecto, trabalharemos com o artigo 2° §2° da CLT. Analisaremos os aspectos empresarias do controle, grupo, consórcio, desconsideração da pessoa jurídica, com foco naquela consolidação.

Assim dispõe o artigo 2°, §2°:
Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.



ULHOA (488) distingue as ligações societárias da seguinte forma:
  1. Controladora e controlada: a segunda é definida como “aquela de cujo capital outra participa com maioria dos votos nas deliberações dos quotistas ou assembléia geral e tem poder de eleger a maioria dos administradores”. A primeira é a “titular do direito de sócio que lhe asseguram, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e poder de eleger a maioria dos administradores de outra sociedade, controlada, e dirige efetivamente os negócios sociais”
  2. Coligadas: “participa do capital da outra em pelo menos 10%, sem controlar”.
  3. Simples participação: Sociedade não anônima que “titulariza menos de 10% do capital social com direito a voto de outra sociedade”.
  4. Subsidiaria integral: adota sempre a forma de anônima, podendo ser “originariamente unipessoal, quando constituída por escritura publica, cujas ações são todas subscritas por uma sociedade empresaria brasileira (de qualquer tipo); ou pode resultar da incorporação de suas ações, operação que não se confunde com a incorporação de sociedades”
  5. Grupos: “combinação de esforços de sociedades para realizar objetivos sociais”, podendo se subdividir em categoria de fato e de direito. A primeira para qualquer sociedade que se encontre em relação de controle ou coligação e a segunda para quando a “combinação de esforços é formalizada por uma convenção registrada na junta comercial”.
  6. Consórcios: constituição, entre companhias ou outras sociedades sob o mesmo controle ou não, da “união de esforços para executar determinado empreendimento, sem resultar na criação de uma nova companhia”.

Nas duas ultimas somente se estabelece solidariedade, “por sanções decorrentes de infração de ordem econômica, por obrigações previdenciárias ou trabalhistas (artigo 2 §2 da CLT)”

É o que se infere da resolução nº 96/2000 do Tribunal pleno que alterou o enunciado 331, suscitado na uniformização de jurisprudência do TST, alterando-a para a seguinte redação:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE. IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e contem também do título executivo judicial (artigo 71 da lei 8.666/93)




Em termos de controle ou direção da prestação do serviço, o autor busca dividir os auxiliares da prestação em dependentes e independentes, sendo os primeiros, os que prestam serviços sob a forma assalariada, submissos hierarquicamente ao empresário e o segundo não se subordina hierarquicamente ao empresário. O independente somente colaborando apenas em atividades externas à empresa, possuindo autonomia.

A respeito do grupo econômico discriminado no §2° do artigo 2°, apesar de não se ter utilizado o termo técnico mais apropriado, buscou-se com isso a proteção, em face de empresas agrupadas de forma fraudulenta, se eximisse da responsabilização.
ULHOA (2008, pg. 6) explica que:
(...) sociedade empresaria é a pessoa jurídica que explora uma empresa. Atente-se que o adjetivo “empresaria” conota ser a própria sociedade (e não os seus sócios) a titular da atividade econômica. Não se trata, com efeito, de sociedade empresarial, correspondente à sociedade empresária, mas da identificação da pessoa jurídica como o agente econômico organizador da empresa.

(...) no direito societário, a sociedade é a empresaria, e não seus sócios. Estes serão chamados, aqui, sociedade de empreendedores ou investidores; no primeiro caso, para a identificação dos sócios que, além de investirem capital, são responsáveis pela concepção e condução do negócio e, no último, dos que contribuem apenas com capital para o desenvolvimento empresa

A 2° turma do TST no RR TST-RR-534.785/1999:
A caracterização do grupo econômico não se restringe às relações inter-empresariais hierárquicas e assimétricas. Basta à existência de uma relação de coordenação entre as diversas empresas para que se configure a hipótese do artigo 2º, parágrafo 2º, da CLT

A desconsideração da personalidade jurídica, segundo Ulhoa (2008, pg. 32), justifica-se episodicamente como “pressuposto da repressão a certos tipos de ilícitos”, onde seu objetivo é “exatamente possibilitar a coibição da fraude, sem comprometer o próprio instituto da pessoa jurídica, isto é, sem questionar a regra da separação de sua personalidade e patrimônio em relação aos de seus membros”.

O disregard doctrine ou piercing the veil possui duas teorias que tratam do tema, sendo uma mais elaborada e outra menos elaborada.  A mais elaborada ou teoria maior, busca afastar a autonomia patrimonial, quando da hipótese “manipulação fraudulenta ou abusividade do instituto”.

Já a teoria menor ou menos elaborada, consiste no afastamento em “toda e qualquer hipótese de execução do patrimônio de sócio por obrigação social, condicionando o afastamento do principio da autonomia à simples insatisfação do credito perante a sociedade”. ULHOA (2008, pg. 36)

O Supracitado autor (2008, pg.37) formula, ainda, quatro critérios para o afastamento:
  1. Abuso da forma da pessoa jurídica:  “qualquer ato que, por meio do instrumento da pessoa jurídica, vise frustrar a aplicação da lei ou o cumprimento da obrigação contratual, ou, ainda, prejudicar terceiros de modo fraudulento”.
  2. Preservação da autonomia: “não basta à simples insatisfação do direito de credor da sociedade para justificar a desconsideração”
  3. Normas sobre Capacidade ou valor humano: “levam-se em conta as pessoas físicas que agiram pela pessoa jurídica”.

O item 2 apresenta um critério para preservação da pessoa jurídica que conseqüentemente põe em terra a teoria menor da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. O item 3 é um critério que deve ser utilizado para resolver questões de nacionalidade, raça da sociedade empresaria, já que não pode haver confusão entre pessoa física e jurídica, cabendo a desconsideração para “aplicação de normas cujo pressuposto seja diferenciação real entre aquela parte”.

SIMONETTI entende que:
(...) haverá desconsideração da personalidade jurídica no caso de várias sociedades que estejam sob direção, controle ou administração umas das outras e tiverem convergência de interesses, para fins de relação de emprego. Essa desconsideração tem sua importância ao evitar que se burlem os direitos dos empregados de cada uma dessas sociedades, que serão solidariamente responsáveis e não terão autonomia para os fins do dispositivo, como se um só grupo econômico fossem.

É importante deixar claro, se o ilícito for identificado, desde logo, como ato do sócio ou administrador, não cabe desconsideração e sim responsabilização daqueles. Entretanto, já esta sendo possível “desconsiderar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizá-la por obrigação do sócio”, é a chamada desconsideração inversa. ULHOA (2008; pg. 46)

Na teoria menor somente bastaria à solvência da pessoa física para ocorrer à desconsideração.

SIMONETTI conclui seu pensamento lembrando que:
(...) a responsabilidade do sócio quotista pelas dívidas trabalhistas da empresa, em sociedade por quotas de responsabilidade limitada na qual tenha integralizado a sua parte das quotas (hipótese mais comum em que a controvérsia judicial se instala), só pode ocorrer quando demonstrada a fraude na constituição, administração ou desfazimento da sociedade e comprovada a insuficiência do patrimônio social.(...) Querer extrapolar tal responsabilidade, com base no caráter protetivo do Direito do Trabalho, é ir além do que a lei permite. Se, por um lado, o empregado não arca com os riscos da atividade econômica (CLT, art. 2º), por outro a legislação comercial é clara ao estabelecer os limites e as condições em que os bens pessoais dos sócios responderão pelas dívidas da sociedade. O simples insucesso da atividade econômica, por razões alheias à vontade do empresário, não pode importar na sua responsabilização ilimitada, pois, conforme diz o adágio latino: “summum jus, summa injuria”.


Conclusão

Apesar da enorme discrepância existente na doutrina e das questões que foram trazidas ao estudo, apesar de respeitar os posicionamentos diferentes e simpatizar com algumas idéias, deve-se entender que os direitos dos trabalhadores têm, certamente, de ser preservados e a desconsideração, nestas hipóteses de grupo e consórcios, tem de ocorrer, pois somente assim conseguiríamos ver satisfeito à dívida existente.

Claro que poderia ser relativizada, pois sabemos que nem todo aquele que é contratada para executar determinada atividade será considerado empregado, devendo observar neste caso, se realmente possui todos os elementos necessário a configuração da relação de emprego. Pode, também, ser observada a dependência econômica e hiposuficiência, para que possa ser aplicada a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, de forma a não frustrar os credores, principalmente os de dívidas trabalhistas.

BIBLIOGRAFIA


COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: direito de empresa. V2; 11° ed. São Paulo. Saraiva,2008.


FILHO; Ives Gandra da Silva Martins. A responsabilidade solidária dos sócios ou administradores ante as dívidas trabalhistas da sociedade. Planalto. São José dos Pinhas. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_15/IvesGandra.htm> acessado em 31/08/2011, às 13:20:29


PANAGIOTIDOU, Advocacia. Grupo econômico no direito do trabalho.<http://www.panagiotidou.adv.br/003/00301015.asp?ttCD_CHAVE=61344> acessado em 31/08/2011, às 09:20:32


PEREIRA; Luís C. CLT: transferência de empregados. [s.l].<http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/clt-transferencia-de-empregados/32872/> acessado em 31/08/2011, às 13:20:29


REQUIÃO. Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. 1; 26ª ed. São Paulo. Saraiva; 2005


SIMONETTI; Deborah.A teoria da desconsideração da personalidade jurídica e o Direito do Trabalho.Direitonet. [s.l] <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2390/A-teoria-da-desconsideracao-da-personalidade-juridica-e-o-Direito-do-Trabalho> acessado em 31/08/2011, às 13:20:29

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